sábado, 8 de dezembro de 2007


Instantes

... E tudo permanece em silêncio
enquanto estremece o momento.
Sabores densos a prados ou maçãs verdes
flutuam na luz matinal mal filtrada
São palpitações novas de vertigens sentidas
Observo-o indiscreta ou por sensual apetite suas formas esbeltas.
Céus! Parece um Apolo de porte Dionisíaco
livre, despido e de corpo solto.
É um corpo que amanhece da noite que agora acaba
e pelo seu sol deslizo com o resvalar do beijo fresco da manhã.
Há algo suave, quase feminino no seu rosto,
apesar da barba por fazer e a firmeza que desenha seu musculado corpo
seu peito, seus quadris - percorro.
É pecado pela certa. Como resistir?
É o éden, é paixão que apalpa,
o sentido desnudado do tumultuoso latejar do coração,
ao fazer-se amor que assegura um mundo que começa...
..aqui, onde tudo permanece em silêncio
enquanto estremece o instante.

Foto by: Maria treva Flor

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

Quando as borboletas deixam de esvoaçar no estômago


Vais embora?
Não vás ainda, imploro.
Não fujas nesta hora despida
Olha-me na íntima angústia
Dá-me vida, dá-me morte,
Não me deixes no limbo
Deita-me no esquife e corre os ferrolhos
Aqui tens a chave, usa-a
Balanceia-te no perfume agridoce da morte
Outorga a minha inocência mumificada
Não és tu o meu anjo, o meu demónio
O risco e o feitiço de um tão esquivo amante?
Então fica. Celebra a minha morte.

Foto by: Maria treva flor

segunda-feira, 26 de novembro de 2007

Na rota do ser


Deita-te nú sobre a pedra tumular do meu peito
Empenha-te a agasalhar mais além dos limites,
nos odores inquietantes dos púcaros dispersos
Bebendo no frenesim, ao cair nas suas águas livres,
envolto em sonhos inacabados.

Ultrapassa-te, faz-te sonho
Num sonho sem fundo,
percorre-o e fecunda-o comigo
Onde estou? Acaso morri entre meus sonhos?

R.I.P.
Foto by: Maria-treva-flor

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Manifesto de silêncio



Avança lentamente
um passo mais.
Encontremo-nos talvez
nos umbrais deste poema.

Nega-o, apaga-o
ainda não se fez.

Apenas tu e eu
no silêncio de um possível verso.


Deixa,
Que o silêncio emane o teu silêncio
e que uma inquietude te traga, o meu silêncio
Com o mundo que interpretas
para que humildemente eu te sirva, a interrogação:
Calada
Secreta
Sem palavras.

Na imanência oculta que nos atrai
a substância atónita da alma.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Diálogo de vultos



- Onde estamos?
- Estamos mortos.

E sem prestar a mais leve atenção, entregamo-nos
Como quem surge da bruma, sem alguma inquietude
descarregamos o fardo das intempéries nos tordos recantos.

Foi o amanhecer de Primavera manhã
Alisamos o cansaço da pele
de chuvas e ventos
Sentamo-nos lado a lado,
e foi viver os aromas da estadia.

Dêmo-nos ao coração singelo
Incendiou-se melodias
já esquecidas, da água e do fogo
Encorajamo-nos a preservar
A não sofrer amarga morte.

Diante dos nossos olhos, estenderam-se caminhos
que conduziam à vida
Abraçamo-nos.
Um ao outro num abraço demorado
Poderosa luz que infundiu nos nossos lábios.

Com olhos d´ água e fogo d´alma
caminhamos até ao horizonte
Pedimos uma última palavra:
- Com que nome poderemos recordar-nos?

Quase sem voz
acenamos um adeus
E, desde então nossa vida tem sido apenas
Esperar por nós, sabendo-nos ressuscitados.
Foto by: Maria-trava-flor

domingo, 30 de setembro de 2007

Esquecer-te é esquecer-me de mim


Como vou esquecer-te se ao esquecer-te serei uma ruga mais
que se inscreve no rosto do cansaço
Uns passos sem rasto, uma inerte lembrança
a viver no escuro sob a noite pétrea sem espera e sem alma.
Com a obstinada pena, longe da ascensão dos sentidos
quando a vida ardia a quatro braços.
E, fazia resnascer em mim todo um universo, na certeza do percorrer do teu corpo azul relâmpago, que me cravava ao chão e arrancava pedaços ao céu.
Como vou esquecer-te se ao esquecer-te serei uma rugosa estátua de areia mordida pelo tempo
que no aberto espaço não te esquece, desejando sem calma a ineficácia das horas.
Insanidade do tempo, como se fizesse esquecer o que se soube viver e não se quer escapar.
Como vou esquecer-te se ao esquecer-te é esquecer-me de mim?
E, contarei as rugas que se vão pondo.

domingo, 23 de setembro de 2007

Sem eira nem beira


Tenho um estranho ruído em meu peito
Tic-Tac, tic-tac! é seu som.
Parece um balancear de ponteiros, a dançar tontos ao sol da manhã.
É um sobe e desce de roldanas ondulantes, presas a trémulo pêndulo.
De picos, garras e unhas a respirar a cada instante.
Despertam rouxinóis adormecidos, em jubilo de murta e jasmim.
Ver-te, ter-te em meus olhos, sentir-te,
não é coisa vil.
É preciso maneio, dar à corda por inteiro sem falhar a volta do meio.
É no meio que está a virtude (dizem), não estou tão certa assim.
já que estendo arpejos ao sol e ao dilúvio
com estas badaladas entranhas.
Sem eira nem beira
neste paraiso carnal.

sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Quarto crescente



Vem,
Vamos juntos.
A noite chega devagar e estende-se pelos céus,
parece uma criança adormecida a éter sobre a mesa.
Vem,
Vamos juntos.
Por mares incertos que são o refúgios das almas murmuradas.
Passeiam-se por aqui e por além,
como uma névoa que esfrega as vidraças,
passa a língua dentro dos recantos encantos.
Pois já conheço todas,
Conheço bem.
Sei das noites que esvaem as almas em breve agonia
abafadas no vazio de um quarto mais além.
Pois já conheço todos
Conheço bem.
Sei dos quartos minguantes que reduzem a fómulas e olhares,
por todo o horizonte nocturno, aniquilado,
que estreita o medo como uma gelada agulha célere no sangue.
Sei do grito, um grito só, um grito,
antes da lucidez do salto.
E, quando fores salto apenas,
mesmo à beira de ti.
Vais dormir em quarto crescente, a meu lado.
Foto: Maria-treva-flor

quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Aos quatro cantos


Primeiro canto - Vem a borboleta da noite ao relento
Brilha com seu diadema de estrelas
Solta as asas douradas nos céus
Abre a claridade dos batimentos que se propagam
Na noite espectral, despertando os seres noctívagos
Onde tudo é rumor, olhar, inumeráveis palpitações
Cumpre-se a luz no seu Zénite em reluzente desnudar
Como se dormisse levemente, entrelaçada, atenta
ao vibrar presente de apenas uma borboleta.
Segundo canto - Tudo é acariciado pelas tuas mãos.
Surpreende-me e assobia ao meu ouvido
Abre a tua chaga de mil cantos
com esta aliança pura de sangue que te reclama
Como se fosse uma conturbada nota que muda de tom
Não é dor. É doçura, é amor que te enlaça por inteiro
ao roçar numa delícia ténue que jamais poderás esquecer
Pacto sagrado, elevado ao canto confidente que me imola.
Terceiro canto - Porque pensaste conhecer-me
na tua solidão desamparada
Mas o fogo é espaço que nos olha e nos despe
que altera a matéria e o destino
Não estranhes pois,
que eu cante no denso e tão breve clamor de um pavio
Raptando instantes de vida, para viverem comigo a minha vitória.
Quarto canto - Cascatas de amor parecem me deter
Um obstáculo de fontes precipitam-se
Brincam indolente com o fogo que se avizinha
Quem desposou a água com o fogo
Ungidos de terra e vento agreste
Para fecundá-los com um amor rebelde?
Foto: Maria-treva-flor

quarta-feira, 12 de setembro de 2007

Porque choram meus olhos


Na verdade, nem eu sei
porque choram meus olhos
Cansados cansados olhos
Adormecei.
A cada golpe tremem
quando o açoite vibra
Estala estala e gemem
A cada golpe que desiquilibra.
Caem no chão curvados
em seus magros perfis
Escravos e condenados
A verem coisas vis.
Das vidas, mortes duras
Olhos, chorai chorai
Um dia tereis armaduras
frente às injustiças mundiais.
Só não chora quem não vê
Só não vê gente insana
Só não sente quem não crê
Na insigne dor humana.
Foto: Maria-treva-flor

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Mutantes


Somos sangue que corre como rios dentro de nós
que nos empurra, nos segura, nos devora
Somos montanhas de esperança, desertos de sede,
mares de raiva a quebrar-nos os braços do medo e da loucura.
Somos raízes que se agarram às areias movediças
que se movem sobre pedras
Somos a significância que pulsa nas palavras
arrancadas aos gestos com chicotes de fogo
que nascem no passado e se transformam na nossa essência.
E abrem, abrem, abrem os limites fechados do presente,
entre prenúncio de morte e o nada
Somos tudo
Somos nada.

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Pergunto


Quando chegou, anunciou-se em arrebatação que tudo pode
Foi motim de carne caprichosa, poema inacabado
Foi pulsar extremo do Y grego e o T sobre o chão exausto
Foi valsa, bolero, estremecimemto de um oboé.
Foi-se embora, deixou-me o vazio
Por onde andará aquela arrebatação que tudo pode?
Pergunto ao vazio que nunca me esquece
mas não me responde.

terça-feira, 28 de agosto de 2007

A poesia que fazemos


A poesia que fazemos quando na nudez das nossa almas
segredamos segredos, nascidos no mais profundo de nós
Incendiando a noite de sonhos insconscientes
que abrem todos mistérios ao mistério supremo de se fazer amor.
A poesia que fazemos quando nossas almas se unem e se digladiam,
num luminoso bailado de sombras e luz
Ao ritmo e compasso de voluptuosos ondulares dos nossos corpos
a resvalar nos toques de ingenuídade e, de felina doçura.
Somos dois corpos enamorados na mesma furtiva alma
Alquímica fusão da àgua e do fogo
E eu respiro-te.
Bebo-te.
Invoco-te, incendeio-te, propago-te.
Infatigáveis, fazemos poemas.
De acordes perfumados a magnólias púrpuras e líquidos reflexos de paixão acesa.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Porque amanhã não estou aqui


Espera, não vás ainda
Deixa-te ficar só mais um pouco
Deixa que eu te agarre sem que nada me detenha
Porque amanhã não estou aqui.
Deixa-me amar tuas faces sucessivas
Todas as latitude do teu corpo
Lamber-te a alma
chegar ao paraíso, apagando o tempo
Porque amanhã não estou aqui.
Deixa que eu viva este último momento
a ponta do punhal a chegar ao fundo da medula
Porque amanhã não estou aqui
e tu distante, nem de mim sabes.
Foto by: Maria-treva-flor

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Carta Registada


Mãe, quando meus olhos mordem esta terra escura
sinto o peso, sinto frio
Retenho então a tua presença distante e sempre pressentida
na minha própria história escrita pelos teus passos.
Hei-de resgatar a nossa vida!
Nem que seja numa só feliz imagem, pulsando na memória,
Os anos que não vivemos,
As guerras que sentimos.
A cúmplicidade de um olhar.
Acaso apenas seja o tremor de um instante, na presença desta manhã.
Mãe, quero ficar, ser o teu sol primeiro,
O raio ninar de um regaço
que, ao se unirem, o amor proclama
pela simples felicidade de estarmos juntas
e, que nem esta terra escura consegue nos separar.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Caixa de ritmos


Adivinha-se num reflexo o pulsar
sob a esponja de mil sons
Cede-se à hipotermia
Não é todo o corpo um placebo de raízes cinzas
cuja última faúlha faz gretar a respiração?
Pois bem...avança num arraso
O ar desenrola um espiral à sua passagem
Um punhado de sono adjará a lúcida dimensão do descalabro
Obscena alacridade do sangue tricota relâmpagos de desejo
Graceja insolente de prazer
E...ao absorver, cambaleia.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

नो limiar da próxima dor


Há um refúgio na sabedoria verbal do teu corpo,
onde posso esgrimir a penumbra e o silêncio.
Chegam por esses umbrais até a mim
pela mão da dor apertada e ainda por vencer.
Relatam histórias de confusão e caos,
girando os negros portais da memória,
onde o vazio devora os possíveis amores
e todos os seus começos.
É como tivessem fugido de mim,
no ardor mais fragrante e sempre na sua promessa.
Condição imune ao amor,
ou à forma ascendente como te olho
e, permaneço pensativa e certa.
Unicamente és o beijo que me submete,
ao risco e à plenitude do absoluto.
Citilando lua sobre o limiar da próxima dor
um aroma a magnólia, uma brisa enfeitiçada,
auréola sem fim da pele do milagre.
Mas ainda não compreendo a claridade distinta
que águas negra de estrelas, que música longínqua
te ondula na minha penumbra e silêncio.
Que um só pensamento sobre ti
é agora a minha vida até à morte,
ante a minha indefesa de te amar.
Foto by: maria-treva -flor

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Anjo caído


Com traços tímidos
traço a pulso firme os traços nítidos do teu rosto
Que atravessam distâncias
zonas de luz e noite.
Fundem-se na sua altivez
sem medo nem castigo
nem sequer vingança.
Investido pela força de um brio de vertigem incessante-selvagem.
na crina de um corcel de fogo
semeando brisas e colhendo epífanias
que continuam sempre te esperando.
Quantas vezes terás ressuscitado do fundo do teu anjo caído?
Quantas vezes terá caído uma lágrima profunda"?

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Dança Maria dança


Danço...
No respirar do formigueiro
em meu corpo entorpecido
pelo fascínio deslumbrante
da dança dos sete véus
No fágil movimento orgásmico
arrancado no último dos suspiros
ao último dos céus.
Danço...
De ventre sob os gomos da cúpula do desejo
No espaldar reflectido em mil espelhos
a beleza quase nua de uma luz primordial
No risco delicado da melodia interdita
do bolero de Ravel
que sem rede puxa-me freneticamente em colisão.
Danço...
de corpo rasgado
vestida de escarlate gasto
como se fosses um brinde à vida
Na eterna apoteótica fatalidade
com que os fios escuros do meu cabelo
enfeitados (de-lírios) brancos
pousados ao deléve em meus lábios quase neve.
Danço...
no desespero avassalador
com que dispo o último véu
No puro pulsar de todas as espontaneas
de bailarina sem pontas
que cai em queda livre rendida a teus pés.
Danço...
Contigo, assim...
na liberdade florida de uma dança sibilante
que Maria eu danço enlouquecida
pela lança que me enlança
quando danças para mim
e que eu sei que vai ferir-me de morte
Grande é o ímpeto da vida.
Foto by: maria-treva-flor

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Marcha núpcial

Acalma o teu respirar e adverte o meu

sobre a cama adensa-se a noite

confusa de trovões e presságios

fantasmas alados e lâminas de silex

com os seus elmos sombrios a ofuscar o luar

avançam em desordem e atravessam as pontes levadiças da mente.

É a hora inaudível dos mortos.

O tic-tac persistênte do relógio

verte seus ponteiros rumo à íris de ebano do tempo

soletram as linhas da palma da minha mão

nas oscilações pêndulares dos meus fantasmas interiores.

É tarde para iça-los.

Encontraram a torre errante dos sonhos a partilhar.

Abraça-os, são todas as acções da tua vida

Ergue teu cálice e celebra

O fervor da minha marcha núpcial.

Foto: maria-treva-flor

terça-feira, 19 de junho de 2007

De olhos bem fechados


Permite-me...
que de olhos bem fechados
encerre em ti o grito que levanta o medo em resplandecente encanto
Dispa-me de bruma e frio
na celestial vertigem de ver o mundo
com as suas ondulações de fugaz espuma
e líquidos topázios enraizados no firmamento
das tuas ávidas mãos sussurando-me segredos
Permite-me...
que de olhos bem fechados
cerque o desmembramento do sono fundo dos suspiros
que o acaso estende
sem procurar outra paixão
nem abrir outro caminho
nem outra vida
na vil sucessão de visões em quebra
ao dar-me de corpo e alma, na certeza do inacessível
Permite-me...
que de olhos bem fechados, me permita
Ficar no mar do teu corpo
na ânsia rendida do meu amor
Aquela plenitude que de olhos bem fechados
e de peito aberto invoco.
Foto: Maria- treva-flor

sexta-feira, 15 de junho de 2007

Mentira ébria




Reclamo apenas uma verdade sóbria

no silêncio que não pode ser teu

A firme dignidade da tua triste queda

na angústia que te afoga num espiral de mãos

com o indicador nos teus lábios

Aguardo a chamada na rasgada distância

Aqui, dentro de mim...

onde tudo é uma mentira ébria.

quarta-feira, 13 de junho de 2007

Silhueta sem nome


É sobre a nudez do teu rosto
que de repente a noite cai
Ensinam minhas mãos às cegas
o caminho dos de-lírios brancos
onde a luz indecisa da manhã
demora acontecer
Nas minhas mãos elevo o amor e canto
Tímida melodia por abrir
Canto desassossego que se explícita no ímpeto do desejo
Nesse culminar da minha cegueira
Propícia visão de epifanias
onde se avizinha o caos
A perpétua dimensão de algum lugar estranho
não muito longe de mim.
Que estranha sensação de estar num espaço aberto
Diluir-me na noite que me devasta a pele da alma
Já que eu era sombra e por entre sombras mais
me perdi.

sexta-feira, 8 de junho de 2007

Mar de chamas

Sinto um calafrio de chamas me chamando
no avesso da minha alma obscurecida numa tela invisível
Quem perguntará ao meu frio pela brasa que me queima a alma?
Porque sempre saberei sem saber o que é um mar de chamas interrompido

Nele permanecem o medo, as minhas insensatas perguntas
como estas lágrimas em debandada por labirintos de fumo
nas quais jaz a nudez branca do meu corpo por ti inflamado

No fim digo: que se passa? quem chama por mim?
Ninguém responde na obscura inquietude do meu funeral de cinzas
que ainda me atrevo a respirar.

Foto: Maria-treva -flor

segunda-feira, 4 de junho de 2007

A água que o fogo desejou


Em jubilo queimo-me em teu corpo como se fosses o meu único destino
Vertigem prodigiosa que me eleva a um céu de fogo erguido
Fundem-me com a noite constelada e não posso saber se és definitivo
ou fogo fugaz que me acende onde sem perdão penetro e me diluo
até encontrar a selvática dor de um vazio.
"Igne Natura renovatur intregrum"
(e pelo fogo toda a Natureza se renova)
Foto de: Maria-treva-flor

domingo, 3 de junho de 2007

A persistência da memória




Este velho hábito de me esquecer de te esquecer
De me perder nas sombras dos teus olhos


  • Cair dentro de mim, aos tombos com a destreza nova de uma fadiga antiga


    Cair desenganada, cair no desconhecido
    No infinito do nunca, no nunca que não se agarra e que não se pode ter


    Olhar a distância, desvirtuando a consciência
    Sentir a ausência do tempo em meus descompassados passos


    Esquecer um passado cuja persistência estimula o desenterrar da memória que nunca me esquece.

Foto de: Maria-treva-flor

sexta-feira, 1 de junho de 2007

Auto-retrato (censurado)


Rosto expressivo, olhar desafiador, sorriso malicioso
numa figura atenta ao esplendor do Mundo.
Por vezes de inquietos gestos na imparável procura
Entre a paleta das cores da vida e a vertiginosa respiração dos dias
Tímida, mas não na escrita. Expulsa pela pele, palavras a traços profundos
Suor, veias, torsos, emoções, sempre como um grito de dor e sal
São vagas de profundo ardor, ora doces, ora violentos
Experimentando o ser rebelde que sempre apetece
Desnudada de regras, transita entre o imposto e o transgressivo
Fluindo em jogos de arrepiantes ambiguidades
De amores contrários que se unem e se gladiam
nos esboços interrompidos pela saudosa procura do desconhecido
A inquietude é talvez o traço mais vincado, não fossem os redutos de uma energia primordial
Espectros de uma alma furtiva, perdida, em mil reflexos de transparências purpurinas
Que secretamente brilham no espelho estilhaçado
Sedenta de outras galáxias conduz-se pela cintilante sublimação da matéria
Numa digressão espiritual que é pretexto para que todos os limites se dissolvam.
"cheto fuor, commodo dentro"
(quieta por fora,agitada por dentro)
Foto de: Maria-treva-flor